segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

as esperas


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 as esperas são tapetes estendidos. há quem os prefira lisos e lhes desenhe nos entretempos os bordados que os sonhos tecem com as linhas invisíveis dos dias. outros, escolhem-nos onde a vista se canse e o corpo se ausente. em vez de esperar, viajam.
e quando a espera acaba, os que desenham, bordam a duas mãos um tapete onde o amanhã se passeia. os outros, serão condutores embriagados pelo medo de ficar. e partem cheios de futuros vazios.

sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

sei


sei dessa voz onde carregas a fúria dos tempos. os dias calcados a medo. as franjas tortas onde os teus pés se enredam. das agonias que te atravessam a barriga onde te sobram vazios e abundam vontades que crescem sem ter de comer. e desssas mãos que te pesam inutilidades por não alcançarem outras e se despirem escoando entre elas a vontade de se fazerem margem. dum rio esqecido a que chamaram coragem.
sei

quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

dizem


dizem que me apresse, se me doem os passos, que lhes torne leve o que eu carrego. dizem sem memória, da que eu embalo, que lhes roubo o tempo de ser o que sou. dizem os que contam pelos dedos a vida porque a cegueira lhes cobriu os dias.
dizem como cospem. palavras de fogo. onde se incendeiam.

quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

para o camarote


tinha a mesa posta para o chá das cinco
pontualmente
e o chapéu mais fino arejado e limpo.
à mão o vestido chique para a saída
urgente
a ópera, o ballet não toleram atrasos.
(a conversa em dia na ponta do bico)

para o camarote,
que o palco, cansa!

terça-feira, 22 de janeiro de 2013

da felicidade


sabes da felicidade? sim, cruzo-me com ela por instantes que me tatuam na pele eternidades e me tecem nos lábios sorrisos onde sopram húmidos segredos na frescura dos dias.

segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

um ninho


há um ninho
dentro do teu abraço
onde pousam as penas
deste cansaço
e enxergo-me
inteira
no canto manso que o teu peito
entoa.

sou filha da dor
que me sustenta. e parto.
parar em ti,
será deixar de voar.


sábado, 19 de janeiro de 2013

a tristeza


 rugia um vento forte. a chuva era nascente de tumultuosos rios. e o mar agigantava-se no areal que diminuia. e de tudo sabia pelas vozes que, altas e temerosas não ensurdeciam as que dentro de si corriam.

a tristeza é uma tempestade onde as palavras se debatem em pedidos de socorro que nunca vêm. porque não se dizem. engolem-se em dílúvios imprevistos, em úteros feitos de pó.

e de barro, molda-se o sorriso, na raiz da lágrima.

sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

um homem só


caía-lhe na espalda onde choravam ausências de abraços, o peso da noite que de manso entrara pela frincha da porta. e soçobrava. era um homem só numa casa vazia. e a noite era um caderno aberto na página mais triste dos seus dias.

quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

nas despedidas

não são diferentes
os dias
nas despedidas.
são apenas dias onde as mãos
se enchem de todos
as horas.

iguais às que cobrem o peito
e se soltam na nuvem dum sorriso
e aos prometidos,
agora em queda no aguaceiro
que turvam
os olhos de tudo querer.

tal como no rio, voa a nuvem
ainda antes de nascer.

outra serei


quando voltar a estremecer por entre o tempo de regressar, outra serei sem que o saiba. húmus onde me faço neste ventre de onde não parto. nunca. apenas hiberno.

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devia ter nascido numa pauta adormecida. pousada num regaço onde de cansaços se fizesse o colo dos dias acontecidos. pelo olhar macio a luzir de estrelas cairam as luzes e tremia a noite neste palpitar manso com nome calado, de nada dizer.
tinha o destino onde o passado morrera.

quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

se


se te deixasse estucar, da seda em que deitas as palavras, as paredes com que levanto os dias, morreria em derrocadas onde casulos inúteis sofreriam ausências de borboletas. assim, cubro estas paredes de silêncios onde as palavras se fazem de gestos.nada mais.

terça-feira, 15 de janeiro de 2013

agora





há um caminho amordaçado na fome que te esgana o ventre.

e ele dizia-te ainda há pouco todas as palavras, húmidas a saber ao sal com que lhes bordavas as entrelinhas onde cabiam todos os segredos por desvendar. futuros, chamavas-lhes tu. e eu, pintava madrugadas no céu aberto do teu sorriso.

restàmos quedos.

agora,
neste quebranto que não somos, vive um passado a fazer-se. não somos mais, estes que éramos.

sou-me


sou-me intervalo, na pausa dos dias. no sítio das memórias que de mim rasgas, onde a ternura me teceu por teus dedos na pele arrepiada dos desejos que a noite estremeceu. e desvaneço-me por onde os rios correm. no fugaz sonho de me tornar livre.

segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

dias


dias semeados no campo 
das angústias, 
choram 
aos primeiros raios, 
orvalhos que falam 
a palavra fresca, 
ainda ingénua, a sonhar 
futuro.
 

domingo, 13 de janeiro de 2013

ser a laranja





ser a laranja na tua sede
a redonda palavra
na tua boca
onde o silêncio sopra
segredos
inteiros
rebeldes securas
a cobrir-te a pele.

e nos dias pardos
inventar a luz
sacudir poeira
e deixar em ti
o brilho do orvalho
das manhãs

quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

uma nova canção





porque a lucidez nos enlouquece
acende-se na vontade a força
que estremece
o peito sofrido desta terra onde
morrem apunhalados
os sonhos dos filhos abandonados
a quem lhes rouba a alma
e a razão.

ainda somos memória e gente
no coração.
e juntos cantaremos uma nova canção.

quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

ele


ele sabia dos caminhos como das palmas onde lhe cresciam, diferentes, os dedos que impunes escorriam as águas dos dias na maré dos olhos. ainda descrentes de quanto vira.
havia quem o seguisse, no conforto das palavras onde o sonho arranjava cama e fazia histórias que acabavam ao virar do dia. para recomeçar na viagem apetecida quando a fome apertava e as mãos abertas a agitar palavras como se fossem asas a poisar em ninhos do peito de quem o ouvia.
e os sonhos abriam sulcos em rios que se perdiam de vista. pelo tempo de o ser.

segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

às vezes



às vezes, o caminho é uma descida a fazer-nos leves e ligeiros. a desculpar-se  dos pesos que desalmadamente pendura nos braços onde se precisam forças para alcançar o que os pés não podem.
às vezes, na surpresa de quem tudo falta e até a esperança parece ter deserdado se alguma vez foi mãe.