domingo, 28 de fevereiro de 2010

“Tudo o que nos faz feliz, não pode ser mau, pode?”

“Tudo o que nos faz feliz, não pode ser mau, pode?”

Pergunta-se inquieta ao desenrolar-se do abraço que ainda agora fora conforto.
Como pode ser inquietude o depois da calmaria?
Porque não deixarmo-nos vaguear nas águas calmas e limpidas sem sonhar tormentas?

Ou será que a felicidade está tão sómente na capacidade de fecharmos os olhos e os sentidos ao que está para vir e focarmo-nos afinal no que temos agora.?
Não será mais justo assim? Mais verdadeiro e real?

E não, não pode ser mau. Só pode ser bom o que nos faz feliz.
Seja em que momento for.
Porque somos o que somos pelo conjunto dos momentos que vivemos, com quem vivemos. Nunca independentemente deles. Então se somos ou estamos felizes também os outros o estão. Os outros que estão connosco. Verdadeiramente connosco.
É assim que sabemos de quem somos e a quem pertencemos. Nos momentos de felicidade.

Retorna ao abraço e fá-lo mais apertado. Quase o acorda. Acomodam-se os dois.
Não, não pode ser mau tudo o que nos faz felizes.

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Nem assim.

Quantas vezes me leio e não me reconheço. Estranho a pessoa que se deitou nas palavras que vejo desenhadas na tela branca.
Sou tanta gente dentro de mim. Tanta que muitas vezes não me encontro. E muito mais quando me procuro.

Parece que fujo de mim enredada na minha própria teia.

Vejo um cão à procura da sua própria cauda. Rodando sobre si próprio.
Um pião a girar cada vez mais lento e a cair, tonto. E um cansaço sem nome e sem memória.
Procuro-me neste enredo sem sucesso. Talvez nem tal deva acontecer.

É a eterna procura que me move. Até à exaustão.
E nem assim, então, saberei de mim.

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Às vezes


às vezes apetece-me estender os braços e prolongar-me nos outros.

às vezes, na maior parte das vezes, deixo os braços cairem junto ao corpo e serem só extensão de mim na sombra que mesmo sem luz se inventa para lá do que sou.

é tudo quanto quero. nada mais me apetece.
custa-me já tanto ser tanto quanto sou que nem outra quero ou posso ser.

sou muitas vezes o que não sou. despenho-me nos outros despedaçada de mim.
deixo-me então acontecer. vagueio para longe de todos e de mim também. exilada por tempo indefinido em sítios que não são meus.
o meu lar não tem morada e nunca me sentirei perdida. voltar é um verbo que a minha boca não pronuncia. calada.

o meu destino é ter e não ter. às vezes.

sim. de vez em quando sinto o peso da solidão nos meus braços. quando eles se baixam pesados e não agarram ninguém.

mas também lhes sinto a leveza. quando ganham asas e os sinto voar. posso levantar os braços ao céu. e sinto o vento. e sinto o sol. e a liberdade.

sou feliz!

sábado, 20 de fevereiro de 2010

Se ao menos fosse Primavera...

...E eu pudesse rir das piadas que ouço.
Mas são lágrimas que os meus olhos vertem. E quando me perguntam porquê, digo que é do filme que vejo. Não me sinto culpada da mentira que então digo. Sei que tenho de o fazer. Minha avó não se sente bem e tenho de tomar conta dela. Lá longe sinto que tu fazes uma viagem sem retorno. No meu coração de criança começam a tomar forma as histórias que invento e em que tu és protagonista. Aí nunca partirás. Farei de conta que acredito no que dirão de ti. Farei até o luto. Por dentro estarei em festa porque serás só meu. Só eu e tu saberemos deste segredo. Encontrar-nos-emos neste lugar secreto onde nos poderemos rir dos filmes que virmos e aquecer ao sol duma qualquer Primavera.

Agora é Inverno, festejou-se o ultimo Natal.

Ah! Se ao menos fosse Primavera...
Sabes bem como eu gosto do tempo a crescer. Do tempo das flores miudas a espreitar sorrateiras por entre a preguiça do frio que se despede de mansinho.
Sabes bem.

Por issso és a minha eterna Primavera! E renasço para sempre em ti. E tu em mim.

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

Quanto?

Quanto de mim é aquilo que sou?
Quanto de mim o que mostro e julgam saber?
Quanto?

(Quanto fica por fazer nos apetites e vontades refreados?
Quanto terei deixado de dizer, quantas palavras secaram ou escolheram abrigo dentro de mim?)

Sei que sou também o que não mostro. E muito mais o que não vêem.
E entre tanto que se perde entre tu e mim fica muito daquilo que sou!

Mas sei também que em mim há um mundo de gente que fez de mim o que sou.
E quando os dias passam e as noites embalam meus sonhos cresce em mim outra pessoa entre as pessoas que afinal sou eu.

Serei então a soma do que vivo a par com outros e do que de mim escorre e se mistura aí.

Sou então parte da parte que depositaste em mim. E nas palavras que digo está tanto quanto me disseste. E quando estendo as mãos e percorro caminhos és tu que me acompanhas.

Talvez não importe o quanto de mim é meu. Importa,sim,que estás em mim.

domingo, 14 de fevereiro de 2010

Se não tivesses partido

Se tudo fosse diferente quem seria eu agora?
E entretanto, que foi feito de ti?

São tantas as perguntas que se enrodilham dentro de mim. Vadio por entre encruzilhadas onde se juntam todas as estradas da minha vida. Umas que percorri, outras que deixei por fazer. E pergunto-me se o tivesse feito que seria de mim, de nós.

Descubro a inutilidade de tais viagens. Dos becos sem saída a que nos levam tantos "ses". Afinal as estradas que percorremos, impostas ou escolhidas são o passado que construímos e não há outro passado nem presentes diferentes. Fosse qual fosse a estrada que escolhêssemos, não há ponto de retorno. Restam-nos as escolhas que fazemos agora e os traçados que desenharmos.
Ficam, então, só as memórias do que partilhaste comigo.
Tudo o resto são sonhos que nunca acordarão

E sabes? Ainda é cedo para as memórias que estão para vir. Nessa altura verei e saberei melhor do que vivi contigo. Ainda que me reste já pouco tempo. Será o que me fica mais próximo de ti.
Saudá-lo-ei com um sorriso porque sei que em breve estarei contigo.

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Ser ou não ser...simples.

Nem tudo é simples e por isso mesmo tudo se torna assim.

São os ruídos, as coisas árduas e difíceis que nos fazem ver o outro lado. E tudo parece mais fácil quando os ouvimos e sentimos de novo. Parecem-nos familiares e damos-lhes os bons dias como a quem se vê todos os dias pela manhã.

Como ferro malhado em fogo vivo tomamos a forma do que somos. Mas só assim nos construímos: com as pancadas e dores do dia a dia.
Se tudo fosse calmaria, não saberíamos da beleza das ondas e dum mar bravio. Não lhe ouviríamos a voz e saberíamos menos dos seus segredos.

É o retorno a casa depois de viagens atormentadas que nos faz sentir em paz.
E muitas vezes é preciso partir para descobrirmos quem somos. Atracar noutros portos e sermos doutros também.
É nos duelos da vida que aprendemos o nosso lugar. Vencendo ou sendo vencido mas recomeçando sempre porque o tempo não se compadece de intervalos.
Conhecendo melhor as nossa armas e as nossas fraquezas desbravamos caminho a pulso. Há, por fim, trajectos que já sabemos de cor. E a viagem corre mais ligeira.

Tudo se vai tornando mais simples quando abraçamos códigos e rotas que não sabíamos ao inicio. Damos nomes, sabemos caminhos e o mapa da nossa vida vai-se delineando.

E quando olhamos para traz não nos arrependemos do que foi feito. E muito menos do que ficou por fazer. Ganhamos balanço e continuamos mais seguros porque o passado foi mestre.
Afinal, ser ou não ser simples depende apenas de nós.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

As palavras

Hoje, as palavras que teria para te dizer, não se soltam. E sei que são muitas.
Enovelam-se num canto perdido de mim. E perdem o sentido.
Ouço-lhes as vozes mas não as entendo. Como se tivessem perdido rumo no trajecto que as faz viver.
Não querem, talvez, dizer-te os segredos que tanto calaram. Mas sufocam soterradas no seu peso.
É um turbilhão sôfrego de liberdade.
Mas antes que saiam é preciso que dêem as mãos para se fazerem entender porque sózinhas não o fazem.
Precisam dum peito que lhes dê colo e as embale ritmadamente. E este meu peito está em convulsão.
Talvez amanhã ao despertar lhes decifre o que também escondem de mim.
Deixá-las-ei escorrer livremente e aparar-lhes-ei a queda na palma das minhas mãos.
È no abraço que então te darei que as ouvirás.
E as palavras que de ti ouvir serão a resposta a tanta coisa que procuro.
Porque afinal é nas palavras trocadas que que os segredos se desvendam.

domingo, 7 de fevereiro de 2010

Da morte


...E do quanto agora vivo com ela.

Não da minha, mas a de quem me está próximo.
Lembro-me de ter sonhado e até desejado a morte. Para um fim que não achava possível doutra maneira E agora que que perto de mim se vivem as dúvidas da morte e a despedida eminente da vida, tenho medo.

Medo da dor que se instala na despedida. Do vazio de cantos que começara agora a encher.

Tão pouco tempo temos! E tanto que desprezámos.
Que a morte quando nos atropela não olha ao que fizémos da vida.
Não há calendários nem datas a cumprir. O tempo é de viver, viver sempre.
Num tempo que é de vida e de morte.
A hora espreita-nos sorrateira e o importante é não ter arrependimentos de quanto fica por fazer ou dizer.
Assim o façamos e o digamos sempre que a vontade urge.

Sei da vida a certeza presente da morte.
Não sei da morte mais vida!

sábado, 6 de fevereiro de 2010

Ressaca


Como depois da euforia do álcool vem a ressaca, depois de tanto que vivi, o cansaço instala-se. O peso que estava dentro de mim é-me agora exterior. Força-me a descansar, recarregar baterias para novas investidas.
Por agora sem forças, mas determinada.
Um sono que ainda não é reparador faz-me ausentar de mim. Não tenho memórias dos sonhos que o povoam. Como se não sonhasse, apenas hibernasse. Despida de tudo o que me pudesse apoquentar. No corpo o peso, na alma o alívio.
Depois tudo se recomporá e volta-se à embriaguez da vida.
Bebe-se cada vez com mais prudência.Para menores ressacas.
Porque nem corpo, nem alma, podem viver assim tanto tempo em sobrecarga.

No fundo é a memória da ressaca que nos faz deixar de beber.

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

Caso encerrado


Ditas que foram todas as palavras, despidos todos os gestos nascidos no desejo de os fazer cumprir é hora de avançar.
Nada mais há para ser feito.

Tudo toma o seu devido lugar. Concluem-se as histórias que ficaram sem final. Fecham-se em gavetas perfumadas com o aroma das memórias.

Sabes quanto o quis fazer. Percebes agora porque me sinto assim. Sem tristezas ou melancolias. Antes alegre.
Caminho, hoje, leve, sem pesos.Que as memórias quando não nos trazem vontade de voltar atrás fazem-nos flutuar. Ganhar asas para voar de novo.
Sem as saudades que nos amarram a tempos que já não o são.

À pergunta até quando, sei que nunca mais.
Caso encerrado, dirás tu.

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

Como chuva

Como chuva que cai preguiçosamente miúda deixei que se entranhasse em mim.
Não percebi as palavras que dentro de mim ficaram. Como se fossem escritas no vidro embaciado que as nossas respirações deixaram desenhar.
Escorrem lentamente pelos caminhos que não sei seguir. Desenham mapas de terra por desbravar.
Talvez por issso não lhes conheça a lingua.

Sei só que me faz falta a sua presença. Que a desejo e lhe fujo por não a poder legendar.

Apetecem-me dias claros de ver longe e saber o quê.
Que o que sinto tenha a lucidez que a minha razão não consegue desvendar.

Gritarei depois o que sei a quem me quiser ouvir. Tu sabê-lo-ás primeiro.

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Esta noite

Perfumei-me e deitei-me como quem se deita com alguém.

Na cama que encontrei vazia, adivinhei as rotas do sono dele nas rugas dos lençóis. Não havia memórias do seu corpo na forma vazia deixada no colchão.

Juntei os braços no peito num abraço onde já não cabe ninguém.
Aninhada deixei que o sono fizesse pesar as pálpebras e se alojasse dentro de mim.

Estava esgotado o tempo das lembranças.
Todos os sinais estavam já apagados. Dentro de mim, as sombras.
Era tempo de guardar.
A pouco e pouco, com o fechar dos olhos, viajou para onde devia o que restava dele em mim.

E tu, viste-me dar-lhe o ultimo aceno.

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Tu sabes!

Sabes como a pouco e pouco aprendi a guardar nos lugares certos o que havia a guardar.
Aí ficava tudo arrumado e resolvido. Se visitava de quando em quando as memórias que aí conservava, fazia-o com a certeza de não as fazer acordar.
Tirar-lhes o pó ajudava-me a ver mais claro o que de mim ia ganhando ou perdendo.

Era como quando revia a matéria antes dos exames. Tudo ficava mais claro e as dúvidas, se existiam, desapareciam e faziam-se respostas.

Sabes então o que me dói visitá-las e descobri-las ainda demasiado presentes. A fresco deixam em mim marcas que já não queria ter.
Talvez as tenha arrumado demasiado cedo, ou não o devesse ter feito.

Devolvo-me ao passado e tudo surge de novo quando afinal era aqui, hoje, que devia estar. Que queria estar.
Com a bagagem em ordem para a viagem que me espera em cada dia que passa.

Estou agora nesse intervalo que não quero longo. Não o posso fazer assim.
Devo-o a mim e a quem de mim espera respostas. Agora.

Queria não ter de o fazer porque o cansaço toma já conta de mim.
E preciso de toda a lucidez.

Tu sabes!

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Foi o mar...


Foi o mar, talvez. Ou então tanto que havia para dizer.

Na verdade secou-se-me a voz na garganta.
A pouco e pouco o som extinguiu-se. Restam murmúrios e um nó apertado.

Chega-te junto a mim, encosta a tua cabeça ao meu peito e descobre na melodia da batida do meu coração as respostas que procuro.
Serão água para a sede que lhes tenho.
E tu, mais uma vez, a fonte em que me abrigo na secura dos tempos.

Foi o mar, talvez.
Ou talvez não.