sábado, 30 de julho de 2011

Conversas ao acaso


Que diabo havia eu de ser senão aquilo que fui sendo?

E tanto já fui e nada do que pensei ou planeei.

A vida tem destas coisas. Troca-nos as voltas.

E ainda bem que o faz. Gosto disso. Sinceramente!

Se tivesse percorrido sempre uma linha recta com traços contínuos, teria já adormecido ao volante, cansada de tanta monotonia. As travagens, as mudanças bruscas de direcção, algumas ultrapassagens, um ou outro encosto, levaram-me por caminhos impensados. E sabes? O meu destino, não tem destino.

Terá sim um fim qualquer que não adivinho, nem me inquieta.

Até lá vou sendo o que for. Se por dentro continuar a ser eu. Valerá sempre a pena! E sinto que vou continuar a gostar.

Adoro esta viagem. Nem imaginas quanto. Mesmo nos deslizes, acho que até por eles.


sábado, 23 de julho de 2011

É para lá que vou


Nada mais a fazer. Improvável recomeçar.
Esvaziar-se das histórias, mesmo sem pontos finais. Largar as mãos que antes se tocavam.
E nas lágrimas que agora correm, só um destino se faz. Longe do mar da tua boca, secam na sombra dos meus lábios. Sabor tépido, a sal.
Quando as lágrimas secam, incendeiam-se ,são fogueira e clarão mais e mais intenso. Calá-las não seca a nascente, mas revolve as entranhas do peito.
São então lava dum vulcão que nunca adormeceu.

É preciso abandonar o sítio a que pertencemos.
Há ainda lugar, algures...

É para lá que vou!

quinta-feira, 21 de julho de 2011

Sabe bem partir


Acabaram-se os desejos e não ficaram saudades. Deixaste em mim a indiferença.
Acaricio o que em mim deixaste com a maior das ternuras. Posso assim, voltar ao que sou.

Aliviada, sigo o meu caminho. Não me és nada. Nunca o foste!

Quando um dia me perguntarem quem foste, não te saberei dizer.
(Um muro de gelo intransponível. Ao longe a chama, a voz, o apelo... um sonho. A lisura alva, lonjura.)

Para nunca mais.

Assim sabe bem partir. E regressar de onde nunca se devia ter saído.

terça-feira, 19 de julho de 2011

Um dia


Teus braços estendidos, eram ramos onde me deixei acolher. Da brisa que por mim passava julguei carícias e sonhei murmúrios que de ti vinham. E quando o sol me beijava eram os teus lábios que via nos meus. Folha a folha construí um ninho tecido nos sonhos que de ti fiz.

Um dia acordei, rompi as teias da ilusão. Abri as asas que ainda ninguém me tirou e voei de ti.
O orvalho da manhã teve sabor a sal.

O pó do deserto soube-me por dentro. Até ao voo picado no mar que me esperava.
O meu mar.

E fui peixe para que nunca mais me vissem lágrimas.

quinta-feira, 14 de julho de 2011

Um piano ao longe


Uma tábua a gemer surpreende-lhe os passos presos na melodia de um piano que se ouve longe.

Há muitos anos sonhara a casa. Juntara dinheiro, rabiscos, rascunhos e recortes. Sim, já sabia como ela seria ainda antes de a ter de pé. Procurou quem lha construísse. Os melhores. Trabalhou a par com eles. Tinha o sabor da casa nas mãos. Escavou-lhe as entranhas e ergueu-a sólida. Depois acendeu-lhe uma lareira, bebeu um vinho branco e leu um livro ao cair da noite. Todas as noites. Um piano ao longe.

Um dia trouxe a mulher que lhe incendiou o peito e floriu a alma. Na casa as janelas sempre abertas deixaram os sorrisos voar para os relvados, onde cresciam agora crianças. Foi tudo rápido, foi tudo cedo. E as manhãs caiam e as noites levantavam-se penduradas em estrelas a iluminar sonhos sempre a crescer de pernas altas. Corriam mundo, os sonhos. Os filhos também. A casa ficava. Inabalável como ele a fizera.

Dormia como se a carregasse no seu colo. Enlaçava-a e mesmo sem se dar conta balança-a docemente. És o meu mar, dizia-lhe ela. E tu um peixe, meu amor. E deixava-a entrar em si. Para além de tudo, o inesperado. As mãos são fortes e têm cheiro. Não precisam da voz e em todos os silêncios se encontram.

Ainda agora que ela para sempre se afogara nas suas memórias e só mar ficara. Colo eterno e a balancear rumos. Para a frente, ouvia-lhe ele. E não precisava de vasculhar o tanto que ficara para trás.

Precisava de arranjar aquele degrau. Calar-lhe o gemido. Ir até à casa do vizinho com uma garrafa de vinho branco e beber com ele enquanto ouvem o piano. Talvez acendam a lareira e falem dos livros que leram ou das mulheres que nunca tiveram.

quarta-feira, 13 de julho de 2011

Noutros tempos


Noutros tempos estendia-te já os braços. Ainda antes de mos pedires. Sem mesmo saberes que aqui estavam prenhes do teu corpo. E o abraço fecundado pelo tempo da tua ausência calaria a voz de todos os esquecimentos.

Este é o tempo das memórias amordaçadas. De braços caídos recuso o dia que passou.

Numa nesga qualquer julgo saber que um dia serei o braço do abraço de alguém. (terá sido ontem?)

segunda-feira, 11 de julho de 2011

em tempo


sinto o teu sopro manso e um arrepio leve anuncia a sua chegada.
é um soluço que em espasmo desfaz o novelo que volta a fechar-se.

chove aqui e ainda agora fazia sol!

intervalo

o toque esquecido, já.
intervalo dorido e o voo de asa quebrada.
o sabor das memórias embrulhadas na rapidez dum adeus que não se quer.

emaranhados...

um rodopio sem fim.

sábado, 9 de julho de 2011

Regresso


Sobram-me as tuas palavras neste silêncio, interregno, plantado a esmo. Deserto árido de ti, de nós.
Agora sufocam-me e no meu peito não encontram saída.
Adormecidas, sim. E de novo agora em sobressalto. Sacudo meus cabelos. É uma lágrima que vês, acredita. Regresso à bruma porque é lá que pertencemos. E nunca lá as palavras se desvendam.

quinta-feira, 7 de julho de 2011

Coisas reais


Falas-me de coisas reais. E como me apetece viajar agora por outros mundos e outras histórias.
Farta de contas e mudanças.
E como gosto de mudanças sem contas agarradas.
A mudança faz-me sentir viva.
Ajustar trajectos mesmo que o destino seja ainda o mesmo é quase um vício entranhado.
Aqueles desvios que me levam a lado nenhum e a coisas tão diferentes daquilo que às vezes nem imagino...
Mas esses só quando me permito e não quando me impõem. Aí convenço-me que me fecham portas mas se abrem janelas, que não perco mas sempre ganho.
Visto os sorrisos que tenho sempre em reserva e bem abotoados para não me caírem enfrento os caminhos, agora novos e descubro o que aí vem.
Ainda sei de cor a esperança. Não lhe perdi a memória.
Dizem que tenho na alma a serenidade plantada. E que não lhe falta rega.
É da planura, digo eu.
E de olhos lavados vou caminhando, estes dias, neste país que ainda é meu.

quarta-feira, 6 de julho de 2011

Porque

Porque a vida é para celebrar todos os dias e na vertigem nos esquecemos de o fazer, celebramos aquele em que abrimos os olhos pela primeira vez.
Que venha longe o dia em que de olhos fechados nos despedimos dela.
Até lá, resta-nos viver a vida com a intensidade que ela merece!
E sempre com um sorriso.

O regresso

Um dia, de olhos fechados para esta vida, o regresso a um útero faminto das promessas cheias do tempo cumprido em sítios alheios. E as coisas julgadas perdidas, agora reencontradas, as pontas soltas apontadas ao rumo enfim descoberto. É a hora dos regressos. Desaconchegar as memórias e desejos. Não voltar a ter saudades!