sexta-feira, 28 de maio de 2010

A resposta



Ele sentou-se à frente dela com as certezas deitadas em cima da mesa. Olhava-a à espera da confirmação de que precisava. Lembrou os sinais, as dúvidas e questões da batalha travada entre a razão e o coração. E tudo lhe parecia impossível. E tudo lhe parecia certo.
A ela, com a admiração suspensa, restava-lhe escutá-lo. Saborear cada palavra que afinal também navegava dentro dela. Já há algum tempo.

A resposta que lhe deu veio num tocar de mãos que se fez abraço.
Brindaram então à descoberta que deles emergia e fizeram-se ao caminho ansiado.

domingo, 23 de maio de 2010

O tempo


Era chegado o tempo de tudo voltar. Mesmo as coisas de que ela não gostava e sempre apareciam. Mas de forma diferente. Uma saudade insidiosa instalava-se de mansinho. A saudade de que ela fugia e se recusava a viver.

Sentada no café do costumo ficava a ver as pessoas passarem. Observava com minúcia todos os movimentos de quem via. Punha a imaginar-se histórias e divagava esquecendo-se de si. A seu lado sentou-se alguém que adivinhou ao sentir-se observada. Podia imaginar a vontade que ele tinha de a ver melhor. Tal como ela fazia com toda a gente. Desviou propositadamente o olhar.

À memória veio-lhe o dia em que se sentara em animada conversa no mesmo espaço com outro homem. O mesmo que agora viajava dentro dela e se insinuava a cada momento com a vontade de rever.
Desejou então que o tempo voltasse ao tempo em que todos os minutos eram eternos.
E o momento que agora lembrava fosse presente e futuro. Como só nas memórias acontecia.

terça-feira, 18 de maio de 2010

Pudera

Começo a sentir-te a falta e ainda aqui estás.
Devoro os últimos instantes com a sofreguidão que tenho de ti.

Sabes-me a maresia.

Pudera eu navegar para sempre em ti!

quinta-feira, 13 de maio de 2010

Um dia...

A cabeça doía-lhe como nunca. Como das vezes que a saudade a assaltava. Desenhando cicatrizes nas memórias do que estaria para vir.

E tudo então seria diferente.
Não percorreria os mesmos caminhos da mesma maneira.

Mas eles estavam lá para ser feitos. O dia a dia a fazer-se rota para um futuro que só nos sonhos dela existiam.
Já era tempo de saber o que estava para além das curvas do tempo. Sem dores.

E a dor a gritar-lhe aos ouvidos. Com tudo a acontecer de novo.
Mal refeitas as coisas em tudo quanto ficou para trás.

Caminhar era preciso. Um dia a dor desapareceria. As lembranças viriam despidas de saudade. E os sonhos seriam só sonhos a concretizar-se um dia qualquer. Não importaria quando.
A esperança fazer-se-ia!

domingo, 9 de maio de 2010

No abraço

Já fazia algum tempo desde que o sol lhe lambera a cara. Parecia estar calmo, mais descansado até. Na verdade acomodara-se melhor quando sentiu o calor que vinha daquela luz. Voltara-se para o outro lado deixando-a livre do abraço que a mantivera junto a ele toda a noite.

Hesitou em levantar-se com medo de o despertar. Deixou-se ficar mais um tempo. Foi a campainha da porta que a fez levantar. Ainda ensonada, vestiu um robe e foi ver quem era antes que o acordassem com mais toques. Na porta, não estava ninguém. Brincadeiras de miúdos, pensou.

Quando voltou ao quarto não o viu deitado. Ouviu a água do chuveiro a correr.
Deixou-o estar. Ocupou a outra casa de banho e arranjou-se rapidamente. Queria estar bem quando se encontrassem.

Voltou ao quarto em silêncio. Queria surpreendê-lo. Não o viu de imediato mas um embrulho em cima da cama desfeita despertou-lhe a atenção. Era um embrulho pequenino. Perguntou-se de onde teria ele vindo e aproximou-se. Foi quando sentiu os braços dele à sua volta. Voltou-se para ele com ar interrogativo. Ele sorriu-lhe. Sim, meu amor, é o que pensas. É tempo de te pedir que continues comigo para sempre.
Duas lágrimas assomaram aos seus olhos. De felicidade.
E foi no abraço que então fizeram que o amor se celebrou.

sexta-feira, 7 de maio de 2010

Não haveria chuva

Estava um dia como o de hoje. Cinzento e triste. A chuva caía miúda e preguiçosa no chão.
Tinha-lhe prometido que sairia. Dessa vez não ficaria em casa a remoer coisas antigas. Mas o tempo em lágrimas arrastou-a para um canto de sua casa. Precisava de sol, de dias alegres e com cor. Esteve assim durante horas. Depois começou a andar de um lado para o outro na casa à procura do que fazer para se alhear de si. Quando o telefone tocou estava perdida a arrumar gavetas e a dizer mal de si por tanta tralha ter juntado. Procurou-o na pilha de coisas que tinha despejado e atendeu. Era ele. Porque não saíste, que desculpa arranjaste desta vez?
Debateu-se em explicações que ele não aceitava. Vou-te aí buscar. Arranja-te. Desligou o telefone e deixou-a a olhar para a ilha que tinha criado à sua volta. Preguiçosamente, levantou-se. Deixaria tudo para arrumar quando voltasse. Teria de se vestir. Meteu-se debaixo do chuveiro e deixou a água correr tépida pelo seu corpo. Pensou no que teria de vestir enquanto se secava e acabou por usar a mesma roupa da véspera. Não se maquilhou como costumava fazer e pôs só um perfume.
Ele chegou entretanto. Estás pálida, miúda. Que se passa contigo? Vem daí.
Levou-a para longe dali. A chuva continuava a cair da mesma forma. Dentro do carro uma música qualquer iluminava os silêncios.
Onde me levas? perguntou a medo. Um gesto de calma e um olhar sereno foi a resposta que obteve. Deixou-se ir. Confiava nele, sempre o fizera. Era o seu porto de abrigo e com ele vencia todas as tempestades.
Dali já via o mar. E como ela gostava do mar! Lembrou-se que tinha sido ali que ele lhe tinha sido apresentado por uma amiga comum. Há muito que já não ia ali. Sentiu o coração bater mais forte. Ele olhou-a de soslaio e percebeu nela a emoção. Continuaram calados até que ele parou enfim o carro. Já era tarde. O dia começava a fazer-se outro e a chuva deixara de cair.
Vamos andar? Saíram do carro e dirigiram-se à praia de mãos dadas. Descalçaram-se e deixaram na areia molhada as pegadas à medida que iam avançando. Em frente o mar como testemunha.
Ele agarrou-lhe ambas as mãos e -la olhar para si. Não quero deixar-te mais tempo sozinha, não quero ver-te mais assim. Vem viver comigo!
Ela baixou os olhos e deixou as lágrimas caírem. Um abraço forte -la poisar a a cabeça no ombro dele. Soluçava quando ele a apertou. Sim, meu amor, liberta-te de tanta tristeza. É tempo de começares a sorrir.
A pouco e pouco ela acalmou-se. Pegou-lhe então no rosto e deixou-lhe um beijo nos lábios.
Ela afastou-se um pouco e de olhos virados para o mar sussurrou-lhe, é aqui que a vou deixar. aqui onde te encontrei. Prometo. Abraçou-o de novo. Foi ao voltar a casa entre tanta coisa que deixara por arrumar que selaram a promessa.
Nessa noite o sol sorriu , o arco-íris coloriu o espaço e no coração deles a alegria fez-se presente.
Não haveria chuva que os desencantasse.

terça-feira, 4 de maio de 2010

De ti

Chego a ti como quem volta a casa e em ti amaro suavemente. De todas as vezes. Sempre como da primeira. Reconheço cada canto teu e sorvo-o com a sofreguidão que têm as memórias de ti. É assim que viajas comigo para onde quer que vá. Nunca te deixo mesmo deixando.

De ti, só quero regressos, mesmo que nunca partas e um matar de saudades ainda que o tempo não as faça sentir.

segunda-feira, 3 de maio de 2010

Diz-me

Diz-me meu amor o que fazemos dos nossos beijos, onde os podemos guardar?

Na memória que deles tenho sobram-me imprecisões. Restam fantasmas que se dissipam nas sombras do esquecimento.

Lembro-me de ter vontade deles e de como eles se faziam noutros beijos.
Carícias a beberem-se sôfregas nos teus lábios. Como se não houvesse mais tempo e todos eles fossem os últimos. Num chegar que se fazia despedida ainda ali.

E agora, que fazemos deles se tanto nos apetecem? Para estarem vivos nas memórias que a ausência nos obriga a fazer. Que sítio mágico os pode deixar pousar em nossos lábios quando a vontade se acende?

Meu amor, tanto longe faz-nos mal.
No deserto árido que se ergue entre nós não se mata a sede que tenho dos teus beijos.
O vento Suão leva-os para distâncias que não alcançamos e morremos um pouco no desejo de os trocar.

Embarco então nas tempestades que tanta saudade me traz e vou à tua procura. Haverá um país qualquer em que o passado se faz presente e os nossos beijos são sempre cedo.

Que pressa...

que pressa tens tu, que nem para mim olhas ? para onde correm os teus pensamentos?
e segues o teu caminho sem dar respostas.
queres que a noite te abrace e devolva ao sítio onde os sonhos se fabricam. nesse outro mundo em que viajas mais devagar sabes que tudo só dura o tempo dum sono. é quanto te chega. eu sei-o.
tudo o mais te devora. sentes-te abafado e não consegues respirar. nem forças tens para o caminho que fazes veloz. é a vontade de te ausentares que te dá o impeto para tal.
e é na música da noite que te deixas embalar. mesmo que os sonhos te perturbem, sabes dizimá-los. basta despertar, estender os braços e perceber que alguém está a teu lado. afinal. um gesto que transforma tanto medo que há em ti.
um dia, se não paráres para me olhar, irás deixar de me ver. e sentir também.
estarei num sítio que nem os sonhos alcançam. e num pesadelo qualquer sentirás a minha falta.