Na mão, a chamada. Nos olhos, a resposta. Na boca, o silêncio.
terça-feira, 1 de novembro de 2016
Do outro lado
Do outro lado é o futuro. Um tempo somado ao que tivemos. E tirado ao que resta. Até lá a vida, dada de presente.
Não acaba tudo na linha do horizonte
Não acaba tudo na linha do horizonte. Mas tudo o que vimos se queda aí. É para lá dessa linha que começa o que sonhamos.
E não se vive inteiramente se não sonharmos.
Não acaba tudo na linha do horizonte.
Não te esqueças
E ao passar não te esqueças. Que há do outro lado o sentido inverso de ficar.
Pelo tempo ritmado da espera. Que em mim respira.
Todos os tempos
Sou, hoje, todos os tempos. Ainda que só ontem tenha sido, o agora cabe- me nas mãos. Nos olhos transborda a semente do que há-de vir. Argamassa que me ergue nos dias.
Sou, hoje, todos os tempos
Coisas simples
É nas coisas simples que a beleza nasce. Ancorada a lugares onde a ingenuidade transparece. É quando nada sabemos que tudo nos é desvendado. Um chão puro acolhe mais fundo a semente.
Sonhos
E os sonhos não passam de sementes. Para nascerem precisam de cuidados. Depois de feita a sementeira. Precisam tanto da escuridão do ventre onde amadurecem, como da luz por onde se espreguiçam. Famintos de acontecer.
O caminho
O caminho para casa faz.se por dentro. Por dentro das indecisões, das faltas e incertezas. Na busca do silêncio que prenuncia a paz.
Sabes pai...
Sabes pai, ainda que longe, é nos teus pés que me vejo a correr mundo. Dançando e trocando as voltas ao que os dias me deixaram. Não importa onde foste se daqui nunca saíste.
Mesmo que os teus olhos se fechem aos meus, nada me apagará a memória do teu colo. Nada e nunca.
Assim mesmo
Não há pecado
Não há pecado algum em querer anoiteceres suaves. Ainda que nem a manhã se pronuncie. Há cansaços acumulados no coração dos dias. E arritmias a tolher.lhes os passos.
O voo
O voo pertence às aves, a vertigem aos homens.
Só quando dá asas aos sonhos que nascem dentro dele, se faz pássaro. E a vertigem se amansa
Aqui
Deixo as velas no sossego. Poupo os ventos ao trabalho. Chegar a ti é um ato solitário. Na intimidade dos gestos amaro no lugar das âncoras. E faço rumo ao lugar a que pertenço. Aqui.
Luz
Não há quem não procure a luz. Mesmo os que parecem viver na escuridão. Esses sofrem.lhe a ausência e calam.na no fechar dos olhos.
Terra
Amaciar a terra na vontade da semente. Ventre antigo. Onde tudo cresce, mesmo alheio à vontade dos tempos. Se a mão souber os caminhos, a boca não mirrará. De fome ou sede.
Um homem só
Era um homem só. Numa cadeira e uma mesa onde o jornal o esperava. Sozinho a olhar os outros. Longe, de outros lugares. E ele folheava as páginas como os dias que atravessava. Devagarinho. O café arrefecia. Pouco importava. E enterrado na vida dos outros, arrumava a sua. Onde não a pudesse olhar. Há lá alguém que goste de se amortalhar, se o coração ainda bate?
Os sorrisos dos que não vê, são.lhe estranhos. Como estranho é viver só.
Entre chegar e partir
Há uma vida entre chegar e partir. E os encontros fazem.se no cruzamento de todos os caminhos.
quarta-feira, 5 de outubro de 2016
O dia é meu
O dia é meu. Abraçado contra o peito. Dia amado na bênção de aqui estar. A entrar nos olhos dentro. Como se amarasse ao cais da chegada.
terça-feira, 4 de outubro de 2016
Despedidas
As despedidas fazem-se a toda a hora. No caminho que agora se faz. Não há voltar quando se sai. Todos os lamentos são escusados. Adia a pressa.
És apanhado
És apanhado. Onde quer que seja, és apanhado. A fuga é o último refúgio. E mesmo aí te apanham.
Redime-te. Encontra-te com a vida. Mansamente.
Não sei
Não sei que língua fala o vento. Ou a calmaria que me apaga os dias. Não sei o que me dizem. E no entanto estremeço quando os ouço.
Gota a gota
Gota a gota. No segundo interminável da dor. A promessa do alívio. Igual a todas as promessas. Inalcançável.
Às vezes
Às vezes chove no teu riso. Como se houvesse a vontade de apagar esse lume que te acende o rosto. E acolhes a chuva porque sacia a sede, onde a secura dos medos morde a raiz.
És casa e corpo onde a alegria mora.
Distância
Não sei onde me guardas a voz, se falas outras línguas que não me saem da boca. E a distância cresce mesmo estando juntos.
Pó
O chão colhe-nos a vida inteira.
Nos passos, mesmo que arremedados,
ainda curtos,
e na luz que se desprende do corpo,
mesmo que negra.
Um dia engole-nos, para nos devolver ao que somos.
Pó. Que doutra coisa não somos feitos. Ainda que temperados pelo sal dos olhos.
Ah, fossemos asa e as nuvens seriam a casa de todas as águas. Onde nos faríamos barro.
Moldado por nossa vontade.
Parece
Parece que a noite vive dentro de cada um de nós. E só a luz do dia a desvenda. Deitando-a a nossos pés.
sábado, 24 de setembro de 2016
A cidade
A cidade já não me pertence. Longe que está na minha vontade de a percorrer. Nos pés trago os cansaços. Nos braços o vazio. De tudo me ter deixado.
Só nos olhos conservo a memória. Que se desbota na linha dos dias.
Até se apagar.
Manhã
Na polpa dos dedos o cheiro da manhã. Nos olhos a colheita. És fruto amadurecido na minha vontade. De te ter.
quinta-feira, 22 de setembro de 2016
segunda-feira, 19 de setembro de 2016
Os poetas são feios
Os poetas são feios. E é da beleza das palavras que se adornam. Um exercício difícil com o qual se debatem em dúvidas.
É na simplicidade que encontram as respostas. Para as dúvidas. Que ora lhes desenham um sorriso, ora lhe semeiam lágrimas.
Não olhes para os poetas. Repara antes nas mãos que dão voz ao que lhes vai dentro.
Talvez assim te esqueças de quão feios eles são. Talvez assim te demores no que vale a pena.
É preciso que a beleza seja alheia ao que vês. Que seja honesto e puro o que colhes quando a semente madura dos poetas nasce nos teus lábios.
quero-te aqui
Quero-te aqui. Neste lugar onde todos os outros nascem. Rente à pele que me veste. A caminho do que os olhos alcançam. Mesmo fechados. Porque é pelos teus gestos que me guio.
sabes
a vida
quarta-feira, 14 de setembro de 2016
alegria
quarta-feira, 7 de setembro de 2016
a equilibrista
esperança
mergulho as mãos, cheias do vazio que me alimenta a febre, no sal com que me temperas os lábios. há um mar a soletrar-me as palavras. que procura pouso nos teus ouvidos.
mas tu amanheces onde eu anoiteço.
somos a lonjura.
pinto a esperança com a cor dos teus olhos.
quarta-feira, 27 de julho de 2016
o dia que espero
Peço à terra que me ouça os gritos. Antes que a voz me desampare. Em nome de todos os que se apagam. Inocentemente.
domingo, 12 de junho de 2016
semente
desde menina andei pelos lavores. era assim que se formavam as meninas no nosso tempo. saía da primária e os tempos livres eram passados em casa de gente prendada nos bordados. em casa tinha outros ofícios. a alguns aprendi o jeito a outros tomei-lhe o gosto. ainda outros ficaram nas esquinas das memórias que para meu espanto acordam quando lhes retomo os caminhos. há quem diga que os genes têm baus ancorados com chaves que de vez em quando podemos abrir. eu tive essa sorte com o baú que minha mãe mesmo longe me deixou. uma mulher que fazia magia com as mãos. não lhe chego nem a um terço de altura! mas a semente tem aqui um lugar.
vontade
haja vontade.
esquecido
sou exilado desse país onde habitam as memórias. e feneço.
quarta-feira, 1 de junho de 2016
estas coisas
quando só estas. nuas e simples. me trazem toda a felicidade.
domingo, 15 de maio de 2016
o passado
quarta-feira, 11 de maio de 2016
a terra
quando voltar à terra lembrar-me-ei de tudo.
sexta-feira, 6 de maio de 2016
preciso
afundam-se os rios que correm em desvarios nesta terra gretada de securas. antigas. sabem-lhe a sal as chuvas que agora lhe fazem cama.
lencóis com que me cubro.
https://youtu.be/Zm5pbLMn8j8
sexta-feira, 29 de abril de 2016
dançar
dizer quanto transborda na pequenez das palavras. inexistentes para quanto te quero dizer.
dançar como quem se despe. na limpidez de quanto diz um corpo nu.
a cru.
quinta-feira, 28 de abril de 2016
dia a dia
de não te ter.
dia a dia, na ausência de lugares onde os meus olhos se demorem nos teus. água fresca. cascata incendiada
a pedir os teus lábios.
dia a dia, rebentas-me nas mãos. e floresces.
mesmo não estando.
quinta-feira, 21 de abril de 2016
os teus olhos
quarta-feira, 20 de abril de 2016
Se fosse árvore
É mulher e aquelas pernas já galgaram campos, aqueles braços muito peso levantaram.
Agora fica-se aqui. E ninguém a acode. O Manel Cardoso vem-lhe à boca nos momentos de aflição. E se demora prefere morrer. Nunca assim se viu. Quando ele chega pergunta-lhe onde está. Perdeu a memória dos lugares. E das perguntas que faz. Repetidamente.
Oh senhor, ajude-me. Não me deixe aqui sozinha. Ai que nunca fiz mal a ninguém...
Por aquelas mãos, agora impotentes, já se esventrou a terra. Já se matou a fome aos filhos. Agora não.
Se fosse árvore talvez bastasse dar-lhe água.
E não se ouviriam os gritos.
91 anos
Ai menina se soubesse da minha vida!
A mãe morreu cedo. Deixou-lhe no colo 4 irmãos. Criou-os na altura. Cria agora os filhos dos filhos.
A voz forte a ressoar pelo quarto faz-se quase inaudível quando lhe pergunto de que morreu a mãe. Tão nova!
Sussurra, de cancro.
E fazemos silêncio.
medo
Fico-lhe muito agradecida . E prende na concha da sua mão, a que chega.
Já se foi embora a senhora do lado? Esquece-se que agarra a mão dela. Da senhora do lado.
Só não esquece o medo.
Isto para os velhos é ruim
Era a noite que lhe trazia as batalhas. As mais duras. Já me deu mais vezes? Não sabia de onde lhe vinha a aflição. E no meio do cansaço prometia. Eu vou arribar.
E arribava.
no teu colo
Amanhã é o princípio de todos os dias. De todos os sonhos. Deixa que aqui guarde todas as tuas dores. Longe de ti.
As minhas mãos estão habituadas a semear. Aprenderão a rezar. E da sementeira virá a flor.
o fim
lavor que incendeia os passos.
sexta-feira, 12 de fevereiro de 2016
das palavras
quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016
o lugar de todas as maravilhas
tinha na cabeça o sonho do circo. lugar de todas as maravilhas. a casa da magia na ponta dos dedos.
e todos os dias se somava nas habilidades a que o corpo pequeno se ajeitava. Subia as escadas do avesso. trepava árvores, mais e mais alto.

que o chão ficava-lhe rente ao corpo, solto das tropelias. eram os joelhos arranhados que a levavam a casa. entre lágrimas e ais.

e era quando o pai chegava, no abraço apertado que ouvia os aplausos dentro do peito a bater.
no quente da cama, aninhava o leão de pêlo. quando as luzes se apagavam, abria as portas ao sonho, embalada pela voz da mãe.
e a magia acontecia. todas as noites. mesmo que não houvesse circo.
a mãe e o pai eram o lugar de todas as maravilhas. a casa da magia na ponta dos dedos.
segunda-feira, 18 de janeiro de 2016
diz-me
diz-me. nos meus ouvidos só cabe a tua voz. mesmo que os silêncios a calem.
ouço-te. no resvalar da pele.