quarta-feira, 11 de agosto de 2010

O ritual

Plantou-lhe duas sementes no ventre.
A primeira deu flor e cresceu na esperança da outra.
Foi quando a agarrou nos braços e lhe fechou os olhos que deixou de ser esperança a semente que dentro dela germinava. E a vida num rodopio a perder o sentido.
Murchou a flor que com ela plantara e um dia viu-se sem a sua memória.
Sózinho , não mais fecundaria nenhum ventre, não desejaria mais nada.
Procurava no vazio encontros fortuitos com uma felicidade fugidia. Tentava capturá-la aí. Um dia já sem forças, partiu. Houve quem dissesse que de dor.

A mãe reservar-lhe-ia sempre lugar à mesa, mesmo que os lugares faltassem, para ele haveria sempre. E o seu prato predilecto.
Mas era quando todos saíam, no silêncio que então ficava, que ela se sentava no lugar em frente ao dele e esperava.
E ás vezes ele vinha. Esticava os braços por cima da mesa. Ela também. Tocava nas mãos dele. Estás mais magro. Ele sorria. Aquele sorriso aquecia-a por dentro, dava-lhe forças para mais uns dias. Sentia-o feliz. Ficavam ali um bocado. Depois deixava-o ir.
Não saía de casa. Não dizia a ninguém. Não podia perder estes momentos. Era o que lhe restava dele. Este ritual dava-lhe vida. Tinha a certeza.

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