quinta-feira, 25 de novembro de 2010

O tempo da ausência


Há muito que deixara de contar o tempo e quando ele lhe disse agora com tal precisão há quanto tempo deixara de a ver, estremeceu. 3 meses, dez dias e 18 horas.

Tinha tudo corrido mal. Um dia cheio de desencontros. Como se nada tivesse que acontecer, nem aquele dia. Como se tudo fosse um rascunho pronto a ser amarrotado e posto no caixote do lixo ou queimado e se tivesse de recomeçar de novo. Alguém, nalgum sítio deveria estar a tentar rebobinar a vida de quantos naquelas horas tentaram acertar passos e palavras, porque na cabeça de todos o dia não passava dum argumento mal escrito, interpretado por actores mal ensaiados, com falas desalinhadas, saídas de filmes dobrados por actores suspeitos.
Ela só queria acordar do pesadelo que se tornara o dia. Convencera-se que dormia ainda e quando acordasse, a vida estaria no sítio de sempre. Alinhada, como as árvores da alameda da estação.

Lembrava-se das folhas, da cor, que cobriam o chão. A única recordação que naquele dia lhe trouxe um pouco de paz. Sempre gostara do Outono. Da cadência na queda das folhas, da despedida dos dias longos de Verão e das férias e muita gente num vai e vem que a confundia.

E de ele partir.

Já nem sabia muito bem como tal acontecera. Tinha tudo guardado para lhe dizer. Tempo para estar com ele. Finalmente ia poder fazê-lo e resolver tantas coisas que andavam a adiar... Aquele maldito telefonema pela manhã, a reunião de ultima hora, o furo mesmo em cima da hora marcada, o cansaço das desculpas, amo-te, gritado ao telefone. Não acredito em ti. Vou-me embora. Não vás. Acabou-se.

E de ele partir.

Era laranja forte a folha que apanhou naquele dia, faz hoje, 3 meses, dez dias e 18 horas, acabou ele agora de lhe dizer. Desceram duas gotas dos seus olhos que ele beijou. Amo-te. Sei!
Espera.
Da mala tira um bloco que abre. Entre as páginas uma folha já seca e descolorida. O tempo da tua ausência. Diz-lhe. Ele amarrota-a, deita-a fora.

Não há ausências. Estou aqui!

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